sexta-feira, 3 de junho de 2011

Greve: o transtorno.

Greve é direito do trabalhador. Ao invés de legitimar o movimento, a mídia ajuda a colocar a população contra por enaltecer os transtornos ao invés de fortalecer os motivos. Esse processo facilita a omissão do governo (ou do patrão), que se edifica e ganha justificativas plausíveis para exigir o fim da greve, através da população que é prejudicada.

Lembra daquele lance de “cada um faz sua parte”? Bonito, porém perigoso. Pensando mais a fundo, em situações como essa, soa quase como aquela outra frase “cada um por si”: o professor ganha pouco e precisa trabalhar três períodos para sustentar sua família, entendo, mas meu filho tá sem aula e ele precisa estudar para ser alguém na vida; o transporte tá um lixo, o valor da passagem (e da gasolina) está um absurdo, e os motoristas ganham pouco, mas quero meu direito de ir e vir sem intercorrências. Sim, temos direito a transporte e educação públicos DE QUALIDADE. O profissional precisa ser valorizado e receber formação e salários decentes. São sempre dois pesos e duas medidas: o aumento abusivo do salário dos parlamentares aconteceu, a mídia divulgou, mas ficou por isso mesmo. Aliás, o que poderia ser feito? Não sei. O Brasil tem uma legislação eleitoral muito complexa, que entendo apenas 0,5% do seu funcionamento. Mas o fato é que com o tal do coeficiente eleitoral, nem sempre os mais votados são eleitos, além dos votos serem conquistados por carisma e caridade, ou invés de ser por projetos e objetivos. Se nossas únicas ferramentas forem greve e voto, a coisa se complica...

E se o trabalhador tivesse outras formas garantidas por lei para reivindicar melhorias, além da greve? Quer um exemplo? Se, ao invés de os motoristas de ônibus paralisarem, eles pudessem fazer o dia da catraca livre. É, em dia de reivindicação por melhores condições de trabalho, o prejudicado seria o bolso do patrão, e não o trabalhador que depende dos serviços prestados. Inconstitucional? Sei lá, é só uma idéia inconveniente...

De alguma forma, a solidariedade de fato foi corrompida. Hoje solidariedade é confundida com assistencialismo. É claro que é insuportável não ter ônibus/metrô/trem para ir e vir, pois é um direito de cada um seguir sua vida, trabalhar, estudar. Mas já reparou como o Brasil está entrando em colapso? A gente trabalha para conseguir pagar os impostos, as contas, comida, remédios, tenta colocar o filho em escola particular, pagar plano de saúde, carro e combustível, justamente porque o governo não cumpre com sua obrigação. Sim, é obrigação do Estado garantir educação, saúde e transporte. Isso sem contar garantir condição de moradia, saneamento básico, coleta seletiva... O povo brasileiro contribui com quatro meses de salário por ano apenas para pagar impostos. O ciclo se completa e não há retorno. É uma inequação social: o pobre cada vez mais dependente do assistencialismo e os ricos cada vez mais detentores do poder.

Mas, a pior parte pra mim é o que estão fazendo com a educação pública. “A falha trágica da cartilha é dizer que se "pode" falarerrado. A gente erra com ou sem autorização”. O mais importante para o conceito de comunicação é ser compreendido, fato. Mas temos também o direito a aprender (e dominar) os outros tipos de discurso além daquele que aprendemos na primeira infância, porque as questões importantes nunca serão tratadas do nosso jeito. Institucionalizar que o português pode ser escrito de qualquer forma é afirmar que você não precisa garantir que todos, sem distinção, compreendam o que é realmente importante para promover alguma mudança social. Tá, tá bom, eu sou pedagoga e discordo dos lingüistas: eterno entrave. Mas me conta uma coisa, será que a redação das leis será modificada em favor da população que não domina a norma culta da língua? Exemplo banal, talvez ingênuo, e possivelmente contestável, mas é fácil dizer que impor um discurso de um grupo social sobre o outro é uma forma de castração lingüística. Mas será esse o caminho para se buscar um futuro mais digno?

“Assumindo o pressuposto de que a sociedade é constituída por regras e convenções que não podem ser ignoradas porque são necessárias ao seu funcionamento e a sua transformação, (...) o ensino da norma culta da língua nas escolas é necessário tanto em termos das relações sociais de poder – saber é poder - quanto pelo fato de que só se modifica e transforma aquilo que se conhece, pois as transformações só acontecem a partir do momento em que os indivíduos possuem conhecimento daquilo que querem transformar. (RODRIGUES, Priscila D. F. Ensino da norma culta da língua na escola: emancipação ou castração lingüística. Campinas, SP : [s.n.], 2010.)

O homem é humanizado pelo pensamento. E o pensamento é constituído do entendimento que cada um faz do mundo. Limite esse entendimento e você proliferará uma população politicamente analfabeta.

O ANALFABETO POLÍTICO - Bertold Brecht


O pior analfabeto
É o analfabeto político,
Ele não ouve, não fala,
Nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe o custo da vida,
O preço do feijão, do peixe, da farinha,
Do aluguel, do sapato e do remédio
Dependem das decisões políticas.

O analfabeto político
É tão burro que se orgulha
E estufa o peito dizendo
Que odeia a política.
Não sabe o imbecil que,
da sua ignorância política
Nasce a prostituta, o menor abandonado,
E o pior de todos os bandidos,
Que é o político vigarista,
Pilantra, corrupto e lacaio
Das empresas nacionais e multinacionais.

A gente cresceu aprendendo que cada um deve fazer sua parte. Talvez nem seja possível entender o que quero dizer com tudo isso. No fundo, somos todos muito egoístas para sermos solidários com uma greve, mesmo porque, quem já esteve em uma sabe a quantidade de joguinho político sujo que existe querendo tirar vantagem própria... E por ai, o movimento perde força e é desacreditado.

Na real, não conta pra ninguém, mas o joguinho sujo existe em todos os lugares onde a ganância é soberana, tá?

Estou cansada de todos esses pensamentos e é por isso que a vontade é mentalizar que “Ignorance is bliss”. Pura contradição, eu sei.

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